domingo, 22 de abril de 2012

A SORTE DO AZAR


Era ganancioso e sem escrúpulos. Construíra uma fortuna tão grande como o rasto de mentiras, de miséria e de morte que deixara para trás. Naquele dia a riqueza fazia-o sentir-se senhor da vida. Dirigiu-se para a primeira classe do embarcadouro com um séquito de pesadas malas de viagem. Antes de aceder à zona reservada ainda teve de desancar um maltrapilho que, estouvado, se estatelara contra elas. Entrou na sala, distanciou os presentes com o olhar, sentou-se e aguardou.
A pancada nas malas do ricaço tinha-lhe deixado marcas fundas. Tentou erguer-se mas a perna não obedeceu. Parecia partida. Sem o ouvirem levaram-no para um pequeno quarto húmido que servia de enfermaria ao embarcadouro. Perdia ali a oportunidade de fugir à desgraça. No jogo da vida a sorte fizera-se azar. Como dantes. Como sempre. E foi com o olhar vazio que viu o imponente paquete fazer-se ao mar. Chamava-se Titanic.

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