quinta-feira, 26 de setembro de 2013

AI LIÇÕES



Beus abigos,

Abós uma brelongada entrospecção axiomático-vinhadeira sobre a ezênzia da sede, concluí que, neste espirituoso mundo em que bebemos, cu existem dois tipos de sede; a sede vinígola e a sede de poder. Guriosamente, esdamos perande sedes com muitos pondos comuns. Em ambas temos castas; na sede vinígola são as castas que apuram o produto; na sede de poder, castas o produto que apuram e depois bê-se. Na sede vinígola temos copos; na sede de poder temos tachos. Na sede vinígola temos gente que gosta de botar para vaixo; na sede de poder botamos em gente que a seguir nos bota avaixo. Barece confuso mas, se boberem um maduro tindo do bom, bom ber que cumprendem num insdante. Voi assim que eu fiz esta reflexão e por mim até continuava a reflectir o dempo que vosse breciso. O porvlema é que no Domingo bou ter de eleger uma pinga. Num gosto da do CDS (Carrascão Deteriorado e Sarrento); num gosdo da do PSD (Pinga Sempre Duvidosa); tamém num gosdo da do PS (Palhete Seco). Todos dizem que adoram o Porto. Pudera, num há outra pomada igual no mundo. Mas, beus abigos, esgolham bem, borgue muitos dezes gue por aí andam a dizer izo, se lhe puderem botar a mão transformam-no numa zurrapa. Tenho pito, quero dizer, dito.

Zaudazões binhadeiras deste vozo,

Manel Bezaina

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

PORTO FORTE?


Caros candidatos,

O Porto é forte. Na exclusão social, no desemprego, nas filas para a sopa dos pobres, nos negócios copofónicos travestidos de revitalização da baixa, no lixo pelas ruas, no cheiro a urina.

O Porto é forte na funcionalismo público tacanho que assaltou a mentalidade dos que tomaram o poder autárquico da cidade nos últimos anos, bem assim como dos seus seguidores.

O Porto é forte na incompetência e na invisibilidade das polícias (PSP e Municipal).

O Porto é forte no estacionamento selvagem e no desprezo pelos peões, com a total conivência das tais polícias.

O Porto é forte na falta de segurança rodoviária, privilegiando os carros em detrimento dos cidadãos. Precisamente o contrário do que se faz nas cidades mais evoluídas da Europa.

O Porto é forte nos seus desertos de pedra, que uns quantos "intelectualóides" pagos a peso de ouro com os impostos do povo ou com os dinheiros vindos da Europa, insistem em chamar praças. Antigamente eram locais aprazíveis onde as pessoas estavam e conversavam. Hoje apenas as atravessam.

O Porto é forte em baldios, em descampados, em lixeiras a céu aberto. Muitos poderiam ser espaços verdes para fruição da população.

O Porto é forte em edíficios decrépitos, a ameaçarem ruína, fruto de políticas que tanto incentivaram a migração para a periferia, contribuíndo para a lucrativa selva de betão que cercou a cidade.

O Porto é forte na poluição do seu Rio Douro.

O Porto é forte nos mergulhos terceiro mundistas dos miúdos nas suas àguas, à procura de moedas, lançadas para deleite de turistas.

O Porto é forte na falta de civismo que as autoridades autárquicas e as policias alimentam com a sua inércia e o seu absentismo.

O Porto é forte na degradação dos seus espaços públicos, de que toda a zona da Foz do Douro é um dos principais exemplos.

O Porto é forte. Na imensa fraqueza que os partidos que vos apoiam lhe infligiram durante anos a fio.

Se ganharem as eleições, continuaremos a ter esse Porto forte?

domingo, 22 de setembro de 2013

É A BUZINA DA JOVELINA



Cessinho Filho,

Acabamos de aconchegar uma orelheira de porco com couve e feijão vermelho que, não desfazendo, estava um consolo. Quando me veio à lembrança que é um dos teus pratos predilectos e tu sem le poderes botar o dente, até se me deu uma pontada do lado direito. Deve de ser as saudades a alojar-se na visícula.

Por aqui, em Afanães, as coisas têm continuado em boa estagnação, tirando o avô Epifâneo. Não sei se foi do bicho se atrasar um bocadito, o certo é que ganhou semelhante cisma ao cuco do relógio que nem queiras saber. Sempre que o bicho vinha cá fora dar horas, punha-se a insultá-lo do piorio. Às tantas, o cuco, já só botava a cabecita de fora e todo a tremer. Passou a ter uma profissão de desgaste rápido. Um dia, o avô enervou-se tanto que, quando tal, pegou no fusil do tio Negos e mandou-le um balázio. Felizmente não le acertou, mas fez um buraco atestado na parede da sala. Por acaso até me deu jeito porque assim passei a ter serventia para a cozinha sem ter de ir à volta pela porta. O teu paizinho, mal ouviu o estrondo, apareceu logo com o bombo à barriga. Pensou que era o grupo de Zés Pereiras a começar o ensaio. Para acabar com o assunto, tive de dizer ao avô que o cuco se apagou. Agora, espero que ele se vá deitar e só depois é que aproveito para ir dar de comer ao bicho, tadito.

O teu paizinho, esse também anda um bocadito diferente. Para desenjoar do bombo, deu-le para cantar músicas românticas. Sobretudo quando vai defecar. A que ele mais gosta é a do " Recordar é viver " do Espadinha. A parte do " Foi em Setembro que te conheci " ainda vai, mas quando chega ao " Trazias nos olhos a luz de Maio " já está em esforço. É do puxar. O romantismo do teu paizinho é um consolo. Cheira um bocadito mal, é certo, mas alivia. O maior problema é o avô Epifâneo. Mal ouve o paizinho a cantar, dá-lhe semelhante ataque de saudades do cuco que desata num pranto. E não há quem o cale. Segue-se que um dia até me apeteceu dizer-le que era tudo mentira, mas o cuco, antecipou-se e apareceu cá fora todo lampeiro. Mal o viu, o avô foi logo buscar a fusca e fez outro buraco na parede. Este vou ter de o mandar cimentar. Ou então mando-o nacionalizar que é o que está na moda fazer aos buracos, não é?

De resto, corre tudo dentro do normal, tirando a campanha para as eleições. Como se esperava, o Toninho recandidatou-se à Câmara. Desta vez anda a prometer que se deitarmos nele vai inaugurar umas termas em Afanães, mas não umas termas quaisquer. Estas só vão ter tratamentos à base de vinho, que é muito bom para o reumático e, a bem dizer, para tudo em geral. Nem queiras saber a quantidade de afaneneses que já anda para aí a queixar-se de reumatismo.

Finalmente, quero dizer-te que um dia destes vamos aí visitar-te e levar-te coisinhas boas de Afanães para te atrofiar as saudades. O paizinho promete que leva o bombo para dar ambiente, está bem?

Até lá recebe beijos desta tua mãe que se assina,
Jovelina

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

DE SUCESSO EM SUCESSO, VAI ANDANDO O ABCESSO


Querida Mãezinha,

Perdi-me dentro de mim
No labirinto do meu ser
E quem me fez perder assim?
As saudades de te não ver

O início desta missiva, ter-te-á, porventura, espevitado para uma legítima surpresa decorrente da minha veia poética. Descobri, efectivamente, que sou talhado para o verso e da forma mais inverosímil: através da minha nova profissão. Com efeito, fui admitido numa empresa de cobranças difíceis que abundam aqui na cidade. Trata-se de um serviço promissor, pois que, verifica-se uma acentuada e até crescente tendência das pessoas para não honrarem as obrigações contratualmente assumidas. Nem essas, nem aliás, quaisquer outras.

Na dita empresa expuseram-me que deveria ser inflexíveil, altivo e até contundente no exercício das funções cobrativas. Mas, Mãezinha, uma vez mais o meu espírito inovador falou mais alto. Considerando que tais métodos não se adequariam da melhor forma ao pretendido desiderato, contrapus com uma abordagem inédita, dizendo-lhes de improviso:

Créditos por mãos alheias
Não conheço essa expressão
Caiem nas minhas teias
Pagam até ao tostão

Convencida a entidade patronal da originalidade do meu método, parti de imediato para a recuperação creditícia. A minha primeira abordagem, junto de um senhor devedor, pautou-se pela rima elegante:

Estimado cliente
Não pretendo incomodar
Mas ficaria contente
Se nos pudesse pagar

Tal como eu, o senhor era igualmente talhado para o verso e respondeu-me a contento:

Falaste bem e depressa
Mas nenhuma orelha te ouviu
Vai falar com essa pressa
Para p...

Naquele preciso momento, Mãezinha, passou uma camioneta da campanha eleitoral e não consegui ouvir a parte final. Bem pena tive porque seria com certeza uma boa rima. Confesso que fiquei com a pulga atrás da orelha.

De outra vez, porém, a diligência recuperativa não logrou um desfecho tão positivo. Assim que soube do meu propósito, o senhor devedor endossou-me uma soca directa à caixa craniana, que me atingiu na zona capilar superior. Sentindo um empolamento, que já me é infelizmente familiar, repreendi-o de pronto:

Desculpe V. Excelência
O que fez foi muito feio
Peço-lhe mais decência
Que, de galos estou cheio

O senhor relapso, retorquiu:

Foge lesto para a toca
Não te metas em apuros
Se não vai a outra soca
Para te pagar com os juros

Nesse dia, experienciei ainda outra vivência recuperativa que, igualmente, não poderei apelidar de agradável, ainda que, dessa vez, tivesse sido mais afirmativo:

O senhor é caloteiro
Sempre com a mesma cassete
Mas eu saco-lhe o dinheiro
Com um golpe à 007

O devedor, porém, não se intimidou e respondeu:

Eu cá não tenho dinheiro
Por isso, que me queres tu?
Vou assentar-te um biqueiro
Nesse olho cego do...

E, antes de acabar a rima, assentou mesmo. Confidencio-te, Mãezinha, que a latejância galinácio/craniana, bem assim como a nova inflamação do enes, resultantes do exercício profissional, trouxeram-me à lembrança tristes momentos anteriormente vividos.

Desconheço se manterei esta actividade por muito mais tempo, mas de uma coisa estou certo; necessito que me endosses com urgência mais um garrafãozinho de aguardente, pelos motivos que são por demais do teu conhecimento.

E com dor assim termino
Mas não quero que tu penes
Num instante fico fino
Quer dos galos quer do enes

Recebe um beijo deste teu rebento amado,
Abcesso Inocêncio Truncado

domingo, 8 de setembro de 2013

EU JOVELINA, SOU UMA MINA


Cessinho Filho,

Espero que continues de boa andadura que ainda tens muito que palmilhar.

Desta vez tenho uma notícia sobre o triste para te dar. O teu paizinho acamou, quer-se dizer, foi acamado e está de todo. Passo a expôr: a semana passada foro as festas de Afanães em honra da nossa senhora da saúde. São umas ricas festas, que dão muito ser à nossa terra. Correram que foi um consolo, tirando a procissão. Estava um calor desgraçado e era assim de povo. Quando a procissão saiu, o Quim sacristão viu a Micas gorda na assistência e ficou baralhado das ideias. Segue-se que, em vez de botar no altifalante da torre sineira o "avé maria", botou o "quero cheirar teu bacalhau, maria". Por acaso até não foi confusão por aí além, porque tanto uma como outra tem a maria. O problema foi o home da micas. Ia ao lado do paizinho a alancar com o andor da nossa senhora, não gostou, largou o andor e foi-se ao Quim. Valeu o Sr. abade que levava o incenso ao dependuro. Mal viu o home da micas a correr para o sacristão, levantou o incenso, rodopiou três vezes e mandou-lo à testa que foi um mimo. O home da micas não caiu, mas começou a fazer um discurso à presidente da República, só que com mais espuma nos cantos da boca. No fim ninguém percebeu nada mas, mesmo assim ,teve uma ovação em cheio. Até o Quim e a Micas batero palmas. O maior problema foi o paizinho. Quando o home da micas largou o andor, a nossa senhora da saúde veio por ali abaixo e atracou-o. O paizinho ficou preso e começou a gritar:
- Ó da guarda! Ó da guarda!
Gritou tão alto que o cavalo da GNR assustou-se. Segue-se que desalancou o guarda, daqueles que uso uma vassoura atrás do capacete, que foi aterrar direitinho em cima do paizinho. E ainda dizem que a guarda demora a vir quando é chamada. Para piorar, uma estepor pôs-se a dizer que a culpa era toda da Micas e a Micas agarrou-se-le aos cabelos. Sei dizer que rebentou semelhante sessão de pinhanha, que até os anjinhos andaro por o ar. Nessa mesma tarde foram presentes a tribunal cinco anjinhos, incluíndo o avô Epifâneo, que teve de fazer de anjinho por falta de crianças, um S. João Baptista que enfiou uma pera no Senhor dos Passos e dois franciscanos. que andaram a puxar o fio um ao outro. De testemunhas foro os três pastorinhos, mas dissero que não viro nada. Pudera, se eles tivesse visto era milagre. O paizinho, esse ficou tão espalmado que agora parece uma solha, com os olhinhos sempre a olhar para o mesmo lado. Por sorte é para o lado onde está o bombo. Tenho-le dado aguardente com fartura para le chupar o pisado e ele não se tem importado por aí além. Vê lá tu, tão devoto da senhora da saúde e foi ela quem o botou de cama.

Mas não te preocupes; à velocidade que a aguardente le está a chupar o pisado, não tarda está outra vez a desancar no bombo com alegria e bravura.

Fico à espera dos teus beijos. Até lá recebe os meus, desta tua mãe que se assina,
Jovelina

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

LIGA DOS ÚLTIMOS


Falou o primeiro e disse
Sem reformas não há futuro
Eu digo que é vigarice
Com reformas é furto duro

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

EU ABCESSO, NÃO TROPEÇO


Querida Mãezinha,

Que um manto de beijos te cubra e, bem assim, ao paizinho, à restante família e a Afanães em geral. Guardo-vos a todos no coração, cada vez mais ateroscleroso de saudades.

Antes de mais, pretendo informar-te de que já não sou cabeleireiro. O Bi chegou ao fim do mês e quis pagar-me em géneros. Eu, sinceramente, achei curto e, modéstia à parte, julgo poder alcandorar-me a coisas maiores.
Senhor de um espiríto assaz pertinente e proficuamente adequado a quem persegue um lugar ao Sol, empreendi uma nova colocação profissional. Desta vez num serviço de reclamações. O estimado colega que me ministrou a formação, iniciou por me incutir o lema maior da repartição:

SE FOR URGENTE TEM TEMPO, SE FOR MUITO URGENTE ESPERA-SE QUE PASSE A URGENTE.

A segunda lição versou sobre a operativa organizacional. Transmitiu-me que deveríamos recepcionar todas as reclamações e colocá-las numa pasta com o título ASSUNTOS A TRATAR HOJE. Tal pasta situava-se mesmo ao lado de outra que tinha por título ASSUNTOS A TRATAR AMANHÃ. Assegurada esta tarefa, sentavamo-nos, cada um em sua secretária e entabulávamos amenas cavaqueiras, líamos o jornal ou degustavamos café, com intervalos de meia hora. Regra muito importante; no final do dia, passávamos todos os documentos que se encontravam na pasta dos ASSUNTOS A TRATAR HOJE para a dos ASSUNTOS A TRATAR AMANHÃ. No dia seguinte voltávamos a transferi-los para a pasta dos ASSUNTOS A TRATAR HOJE, mantendo assim o serviço aprumado e sempre em dia. Posso assegurar-te que o trabalho corria fluente e sem desgaste cerebral ou outro.

Sucede, porém, Mãezinha, que, levado pela argúcia que não deixarás de me reconhecer, entendi ir mais além e criei a pasta dos ASSUNTOS A TRATAR ONTEM. Completei na perfeição o círcuito organizativo com o ONTEM, o HOJE e o AMANHÃ. Passei a recepcionar todos os documentos na pasta dos ASSUNTOS A TRATAR HOJE e no final do dia transferia-os para a pasta dos ASSUNTOS A TRATAR AMANHÃ, conforme me tinha sido leccionado. No dia seguinte, transferia-os para a pasta dos ASSUNTOS A TRATAR ONTEM. Os mais urgentes, passava-os para a pasta dos ASSUNTOS A TRATAR HOJE e os menos urgentes ficavam a aguardar vez na pasta dos ASSUNTOS A TRATAR ONTEM. Só os mudava para a pasta dos ASSUNTOS A TRATAR HOJE, depois de transferir os urgentes para a pasta dos ASSUNTOS A TRATAR AMANHÃ.

Posso afiançar-te, Mãezinha, que o exercício da função jamais conheceu níveis tão elevados de desenvoltura. Por isso, é com indisfarçável orgulho, que afirmo, perante ti, que fiz a diferença. E que diferença. Vê tu que um dia, passou pela repartição um director que denotou tal satisfação pelo meu desempenho que me concedeu logo uma folga. E sem prazo. Nos dias que correm, em que tudo é a prazo, tal atitude foi bem demonstrativa do seu apreço. E de tal forma reconheceu a minha obra que até me disse: - Vai mas é para as obras!

Não coube em mim de contente. Só passei a caber quando o indicado director me endossou as pastas à caixa craniana, com certeira pontaria. Cheguei a pensar que o pobre senhor padeceria de bipolaridade mas, só depois, descobri que não. Sem saber, havia-lhe copiado o método de trabalho, motivo pelo qual não apreciou o meu involuntário plágio.

Pelo exposto e, como terás já certamente depreendido, necessito que me remetas mais um garrafãzinho de aguardente. É que a avaliar pela proeminência dos talos, não tardará e começarão a cantar os galos.

Recebe beijos deste teu filho galado,
Abcesso Inocêncio Truncado

domingo, 1 de setembro de 2013

OLHÓ OS GIGANTONES


- Ó rui acha que...
- Pauloca, não me chame rui, para não me confundirem com o outro
- Pronto, ó mor, acha que...
- Pauloca, não me chame mor que isso é o que as mulheres do povo chamam aos homens delas
- Tá bem. Ó rumor, acha que...
- Pauloca, eu sou um candidato assumido, não sou um rumor
- Muito bem. Ruru, acha que este branco me fica bem?
- Claro, não vê a menina que eu também tou de branco
- Ó ruru, mas pa quê?
- Pa dar um ar sério e dinâmico
- Ó ruru, mas é tão pindérico. Eu gostava de uma peça mais garrida, um colar de pérolas, uma mala louis vuitton, sei lá
- Não seja estúpida. Temos de fazer de conta que também tamos em crise
- Tá bem. Ó ruru e o nosso partido é mesmo o Porto?
- Claro que não. É para nos identificarmos com os tripeiros.
- Ui, que horror. Destesto tripas com os feijões e mais não sei o quê
- Pauloca, faça das tripas coração
- Tá bem. Ruru, só mais uma pergunta
- Sim pauloca
- Onde é que fica Paranhos?

É GENUÍNA, QUE É DA JOVELINA



Cessinho Filho,

Sou-te franca, as saudades são tantas que às vezes até fico afrontada e tenho de arrotar. Sempre alivio a emoção e arejo o canal. A distância que nos separa deixa-me cada vez mais entupida mas, infelizmente, todos estamos expostos aos solavancos da vida. Que o digo o Berto e o Catotas que emigraro para a França no carro de uns amigos. Como o carro ia cheio tibero de ir na mala, que estava toda podre da ferruge. Segue-se que ao passar por um solavanco, a mala assapou e o Berto e Catotas malharo na estrada. Os outros não dero por nada e seguiro viagem. Resultado: estão bem que bem na França e o Berto mais o Catotas foro apanhados a gamar cobre nos postes de electricidade. Não se pode dizer que não tenho subido alto, mas apanharo semelhante descarga que viero por ali a baixo, que parecio torresmos. Lá diz o ditado, quanto mais alto se sobe, mais negro se fica.

Eu também me tenho visto negra desde que a tua irmã Mila arranjou um namorado novo. Não desfazendo, ela até escolheu bem os dezassete primeiros, mas tenho a impressão que este deve ter vindo doutro planeta. A gente fala-le e ele só responde "tá-se", "bué", "cu" ou "cool", ou lá que é. Parece um androide. Por causa disso, a semana passada até houve uma confusão. A Mila queixou-se que não tinha rede para o androide. O teu pai ouviu, foi logo ao Fredo da drogaria e trouxe dois rolos dela. Pensou que o namorado da Mila queria fazer um galinheiro. Só depois é que a tua irmã le explicou que era rede, mas de telemóvel. O teu pai voltou à drogaria mas o Fredo disse-le que dessa rede não tinha, mas que ia já encomendá-la.

Apesar das dificuldades, meu filho, nem tudo é mau. Por exemplo, quando onte acordamos, tivemos uma surpresa que não é para todos; o rio Crostas, que passa aqui em Afanães estava todo azulinho petróleo, que dava gosto vê-lo. O presidente da Câmbra, o Toninho, está até a pensar candidatá-lo às maravilhas de Portugal. Sim, porque rios não falto, mas azuis não há muitos. Isto dá pujança à terra e não tarda está a botar por fora de turistas. O Toninho vai também menagear o Adolfo da tinturaria pelos bons serviços prestados. Por acaso o Adolfo até é um bocado troca tintas, mas há outros bem piores que já foram menageados, de formas que para mim é tinto.

O que interessa é que estamos em boa propagação e até há quem diga que é bom para o rendimento per capita. Por acaso essa história não me cheira bem, porque sempre houve per cá pita e nunca ninguém precisou de a pôr a render.

Despeço-me, contando todos os minutos para voltar a ter nas mãos mais uma escritura das tuas. Até lá recebe uma beijoca daquelas tipo desentupidor da banca.

Desta tua mãe que se assina,
Jovelina