domingo, 25 de abril de 2021

DAS FRACAS REZA A HISTÓRIA

 


Sabia que a Natureza não a bafejara. Era como se uma qualquer ordem divina, do universo ou de coisa nenhuma a tivesse condenado a um destino infeliz para que outras sobressaíssem. E não perdiam tempo, essas convencidas, a zurzir-lhe a fraqueza. Elogios, galanteios e louvores seguiam para elas que, a si, estava reservado o desprezo e o esquecimento. O peso dos anos foi-lhe definhando as pernas, mirrando as costas, roendo os nós mais fundos. Mas também foi esse peso que lhe fortaleceu a vontade da revolta. Queria ganhar ao destino nem que essa vitória fosse o último dos seus gestos. Haveria de alcançar a glória pela força da sua fraqueza. 

Foi num dia de Verão. Viu as outras ocupadas, permaneceu junto à janela com o sol a disfarçar-lhe as maleitas e esperou. Ele entrou de rosto fechado. Os passos austeros das suas botas encaminharam-se na sua direcção. Pegou nela sem sequer a olhar, ajeitou-a a seu modo e depositou-lhe toda a carga do seu corpo. Ela nem rangeu. Desconjuntou-se, partiu-se e, no seu sacrifício, libertou o país de um ditador. Não ficaria na História por fazer uma revolução mas o mérito de ter dado o primeiro passo já ninguém lho poderia tirar.

Sem comentários:

Enviar um comentário